sexta-feira, dezembro 01, 2006

Que quarto poder?

A edição de dezembro da versão russa da revista Forbes foi recolhida e destruída, conforme noticia o UOL. A edição traz matéria sobre a mulher mais rica da Rússia, Elena Baturina, por acaso, mulher do prefeito de Moscou.

A justificativa para a decisão, apresentada pela editora da revista, foi de que a matéria teria desrespeitado "os princípios da deontologia jornalística". Ahã.

Deontologia é o
conjunto de deveres profissionais de qualquer categoria profissional minuciados em códigos específicos. Até aí tudo bem.

Fica difícil compreender que uma editora só tome conhecimento do conteúdo da publicação que teoricamente dirige quando está já está impressa e distribuída (tudo bem - dizem que o Lula também não sabia de nada). O engraçado é que ela só resolveu tomar conhecimento do teor do que se publicou depois de ameças feitas por um dos maiores grupos econômicos russos e que, não por acaso, é dirigido pela Elena Baturina.

Tudo bem que pouco se pode esperar de um país que vem sendo acusado de envenenar (ex-)espiões como
Alexander Litvinenko, que vinha investigando o assassinado da jornalista russa Anna Politkovskaia, morta a tiros em seu apartamento em Moscou. Anna vinha fazendo duras críticas ao governo.

A Imprensa, pelo menos essa, deveria ter o brio de cumprir seu papel social e não deixar que o peso do dinheiro, pressões jurídicas e a violência a façam calar.

A chefe de redação da Forbes, pelo menos, honrou as calças (ou saias, conforme o caso) que veste: ao saber da decisão da editora da publicação, pediu demissão.


O sexo da Dona Benta


Infelizmente não posso acompanhar o desenrolar diário da “obra de Monteiro Lobato”, Sítio do Picapau Amarelo, apresentado durante a semana na Rede Globo. Vez por outra, quando dá pra sair de casa mais tarde e enquanto como meus dois paezinhos matinais, dou uma espiada e tento entender a história e me faz lembrar de quando eu era criança.

No capítulo da última terça-feira, fiquei surpreso com uma cena, pra mim inusitada. Volto a lembrar: não vejo ao programa todos os dias; por isso não conheço os detalhes da trama. Mas vamos aos fatos.


Depois de seguir uma determinada personagem pelas matas que rodeiam o sítio, Dona Benta finalmente consegue chegar à gruta onde mora o “Eremita”, guardião de um certo cristal ou algo parecido. Eles se reconhecem de imediato, longa troca de olhares, segundos de suspense. Em meio a um jogo de palavras, os dois dão a entender que tiveram um affaire no passado, que não teria se concretizado justamente porque o Eremita teria sido obrigado a assumir seu papel de guardião do tal cristal.

Se a memória não me trai, as histórias de Monteiro Lobato (1882-1948), em particular as do Sítio do Picapau Amarelo, são meio como as contadas por Walt Disney. As relações familiares nunca são muito bem definidas e as personagens principais não têm pais nem mães presentes. Nunca entendi muito bem o porquê.

No caso do Sítio, Dona Benta é avó de Narizinho (Lúcia) e de Pedrinho, que são primos. Mesmo na série que passava, acho, nos anos 1970-1980, não me recordo de ter visto seus pais uma única vez. Eles simplesmente chegavam da cidade para as férias escolares e a aventura começava.


No caso do Disney, temos o Mickey com seus sobrinhos Chiquinho e Francisquinho; a Minie também tinha duas sobrinhas, cujos nomes não me recordo. O tio Patinhas é tio de quase todo mundo: do Donald, do Peninha (e ambos têm sobrinhos, estranhamente muito parecidos com eles) e do Gastão – todos primos. Não posso deixar de citar a vovó Donalda, avó inclusive do tio Patinhas. Também têm sobrinhos – nunca filhos – a Margarida, o Pateta e os três Irmãos Metralha, que tinham (acho) três sobrinhos (mas que não eram filhos de nenhum deles).

Mas voltando ao Sítio, o tal Eremita tem um filho (descobriu-se isso recentemente). Tudo bem que algumas histórias têm de ser adaptadas e tal, sob o risco de perder o compasso do tempo. Mas o público que vê o Sítio (salvo marmanjos como eu) não tem idade suficiente para entender tamanha engenharia genealógica. Monteiro Lobato deve estar se virando no túmulo. E a Zilka Salaberry também.

Vou aproveitar para comentar um fato acontecido há mais ou menos seis anos. Estava em casa, com meu sobrinho (na época com pouco mais de dois anos), vendo na TV uma das inúmeras roupagens do programa da Xuxa. Começou passar um desenho. Não acreditei no que via. A história falava de uma mulher, casada com um alcoólatra. Todos os dias, ao voltar do trabalho, de porre, eles discutiam e invariavelmente, ele batia nela. Só pra contextualizar: isso tudo, às 10h da manhã de um dia de semana...

Continuando... De tanto apanhar, um dia a mulher resolveu sair de casa. Passou fome antes de conseguir emprego.... num cabaré, como stripper (... às 10 da manhã). O tempo passa, ela parece esquecer do seu passado. Num determinado dia, o tal marido bêbado-violento aparece no cabaré, meio estropiado e tal e dá de cara com a ex-mulher. Não me lembro como a história acabou. Fiquei tão chocado com o conteúdo daquele desenho que acho me esqueci do final do lance.

Mandei um e-mail para a produção do tal programa, mostrando minha indignação quanto ao que acabara de assistir. Deixei claro que não admitia que meu sobrinho – como tantas outras crianças que assistem TV durante o dia – pudesse ser alvo de um programa como aquele que eu tinha visto. O que esperar, então, do que eu não podia acompanhar.

Fiz questão de ressaltar que assistira àquele por mero acaso.
Há seis anos, o volume de pessoas que usavam o correio-eletrônico para se comunicar com a produção da Globo era muito pequeno. Acontece que nem uma resposta automática do tipo: “Obrigado por entrar em contato com a nossa produção etc. etc. etc.” eu recebi. Muito menos uma explicação no mínimo razoável para terem exibido aquela aberração às 10h da manhã. Simplesmente ignoraram o fato. Isso em se tratando de um canal do porte da Globo. Imagine, então, o que não acontece com os canais, digamos, de segunda, terceira, quarta linhas...